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23/08/2008 - 13:05

Um exemplo de política externa pragmática

A Índia, agora, se apresenta como um país com todas as credenciais para postular posição mais destacada no sistema internacional. Seu governo reivindica, com legitimidade para tal, o papel de ator decisivo para equacionar tópicos problemáticos do mundo contemporâneo, como a notada difícil estabilidade política e social asiática e do Oriente Médio e, em uma perspectiva mais ampla, a administração da mundialização econômica.

Os desafios relevantes, decorrentes do posicionamento estratégico que aquele país colocou em prática nos últimos quinze anos – isto é, ser um ator proeminente das Relações Internacionais – impõem obstáculos de dimensões simétricas à pujança, especialmente econômica, que alcançou nas últimas duas décadas. Urge sublinhar que o êxito da Índia tem não como fonte um ambiente doméstico tranqüilo. Muito pelo contrário. Após um período de descolonização, o país mergulhou em um mar tenebroso de conflitos que envolveram, ao mesmo tempo, questões de natureza étnica, religiosa e ideológica, cujos liames, que, na maioria das vezes, foram absolutamente impossíveis de definir, influenciaram de forma aguda o posicionamento externo deste país.

No caso indiano, a política externa colocada em ação parece estar em completa sintonia com as responsabilidades que vem assumindo na agenda de temas relevantes internacionais. Nesta senda, o governo tem se esforçado para sistematizar a construção de relações de convívio e cooperação com os seus vizinhos e, concomitantemente, ampliar sua visibilidade como liderança regional e potência emergente do sistema internacional. Nesse sentido, é importante destacar que, mesmo nas questões mais delicadas, como a da Caxemira com o Paquistão, está submetida à lógica do pragmatismo da política externa indiana, que coloca o interesse comercial e econômico na frente dos litígios de fronteira e os assuntos de segurança.

Dentro do mesmo prisma, cabe destacar as relações com a China, país com o qual também mantém convívio contencioso mas que, nos últimos anos, se transformou em importante parceiro comercial provocando o salto no valor comercial dos negócios efetuados entre os dois países, em curto espaço de tempo, passando de US$ 200 milhões para mais de US$ 20 bilhões. A política do soft power tem apresentado resultados comerciais auspiciosos. Segundo C. Raja Mohan, em texto publicado pela Foreign Affairs, em julho/agosto de 2006, a China está na eminência de superar a União Européia e os Estados Unidos como maior parceiro comercial da Índia em poucos anos.

Na ótica de Mohan, a macro-estratégia de aumento de projeção de poder indiano está fundamentada em três círculos estratégicos e concêntricos: “no primeiro, que abrange as áreas imediatamente adjacentes, ela busca a supremacia e o poder de veto sobre as ações das potências externas. No segundo, relacionado à dita vizinhança estendida – Ásia e litoral do Oceano Índico –, procura equilibrar a influência das outras potências e impedir que minem seus interesses. No terceiro, que diz respeito a todo o placo global, pretende assumir seu lugar como uma das grandes potências, transformando-se em um dos atores centrais para a paz e a segurança internacional”.

Todavia, hoje, o país participa do ambiente internacional como um Estado que, desde sua formação, não desviou da rota democrática, como uma potência econômica e multicultural. Nesse contexto, a política externa que pratica apresenta desafios similares à brasileira, ou seja, conjugar posicionamento político estratégico com fomento ao desenvolvimento econômico e social. A rigor, principalmente nessa esfera, carece de todas as atenções, pois os dois países ainda apresentam dados preocupantes: o Brasil na área da educação e a Índia na da saúde pública.

Os governantes brasileiros têm muito aprender com a experiência indiana no campo do ensino. As universidades e escolas técnicas indianas produzem dois milhões de graduados, sendo 300 mil não-engenheiros, mais de 200 mil engenheiros e nove mil PhDs. Porém, o aspecto mais importante é a soma eficiente entre massificação e qualidade. Se o Brasil avançou alguns passos na direção da universalização do ensino, retrocedeu quando o assunto é qualidade. Entretanto, quando o tema é AIDS, a situação é oposta. O programa de saúde pública para o tratamento dessa enfermidade no País é referência mundial e recomendado pela Organização das Nações Unidas (ONU).

As convergências de problemas e soluções explicam, pelo menos em parte, a intensa cooperação entre os dois países. Brasil e Índia são aliados estratégicos na Organização Mundial do Comércio (OMC), ambos integram o célebre G-20, formaram com a África do Sul o IBAS (Fórum de Diálogo Índia, Brasil e África do Sul) e estão, lado a lado, no BRIC, bloco de países composto também pela Rússia e China, além de postularem assento permanente no Conselho de Segurança da ONU.

Face ao exposto, não há como duvidar do potencial de crescimento da Índia nos novos cenários, cujos matizes foram delineados pela mundialização. Trata-se de um exemplo de país que faz de sua política externa vetor para do desenvolvimento econômico e social. Da mesma forma, o Brasil, tem desafios simétricos às suas possibilidades, basta equacionar a melhor forma de solucioná-los.

. Por: Sidney Ferreira Leite é consultor do Núcleo de Negócios Internacionais da Trevisan Consultoria e professor do curso de Relações Internacionais da Trevisan Escola de Negócios.

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