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23/09/2008 - 10:39

Essa placa que fala em fim do mundo contém um certo exagero

Está escrito nas "verdinhas": In GOD we trust. Até bem pouco tempo, era possível o trocadilho – empregado por J.K. Galbraith no seu livro sobre a crise de 1929 – :In Goldman Sachs we trust. Depois das débâcles, em diversos graus, do Bear Sterns, Lehman Brothers e Merrill Lynch, seguida pelas declarações dos dirigentes do Morgan Stanley, que afirmam examinar a possibilidade de uma fusão, caso as oscilações de suas ações continuem no sentido decrescente, dos 5 grandes bancos de investimentos, sobrará mesmo apenas o Goldman Sachs. Este, nas últimas 52 semanas, viu sua cotação mergulhar de 250 USD para algo como 100 USD. Possivelmente o velho trocadilho já não sirva mais.

Ultrapassamos a fase de afirmar, com ar superior, não ser esse o nosso problema, dizer com desprendimento tratar-se de um castigo merecido da irresponsabilidade ianque, sugerindo encaminhar as reclamações à Casa Branca, ou decretar o fim do neoliberalismo, levando em consideração as inúmeras tábuas de salvação atiradas pelas autoridades monetárias dos diversos países. Tirando a referência ao irresponsável tratamento dado à aventura das hipotecas ditas subprime, com evidente descuido dos responsáveis que possibilitaram o surgimento desse monstro, com políticas de farta liquidez, poucos controles – responsáveis por uma verdadeira contabilidade paralela fora dos balanços patrimoniais –, e juros baixos, o resto é bobagem.

Claro que esse terremoto, tsunami, tornado etc. afeta o Brasil.

Com o mesmo ar despreocupado com o qual falava-se na "inflação do feijãozinho", estão nos dizendo que haverá uma ligeira desaceleração na economia, em parte compensada pelo vigoroso crescimento do mercado interno e que a eventual saída de capitais – acarretando uma alta do dólar – não deverá nos preocupar, já que brandiremos o escudo das nossas reservas de 200 bi.

Neste momento de pesados prejuízos, as remessas de lucros, pagamentos de dividendos às matrizes das multinacionais operando no Brasil e até desinvestimentos, com a revoada de capitais não podem ser minimizados. Não é só o tio Bob, a tia Mary que tentam desesperadamente repatriar seus caraminguás. Gigantes também o fazem ou o farão.

Os oráculos promovem uma intensa manutenção corretiva de suas bolas de cristal, já que a cotação do dólar não parece se encaminhar para o patamar de 1,60R$. A toque de caixa, as últimas versões fixam novos níveis. Roberto Giannetti da Fonseca já fala em dólar valendo um par de reais dentro de 3 meses.

Nossopresidente avalia que o impacto de uma eventual recessão americana será "muito menor, quase imperceptível", já que nossas exportações para o tio Sam não representam hoje o percentual de outras épocas. É uma "avestruzada" meritória. Ocorre que as perdas do sistema financeiro afetam não só os Estados Unidos. As avaliações do rombo das instituições financeiras variam ao gosto do freguês entre 500 bi e 3 tri. Evidentemente, trata-se de meros palpites, já que uma aproximação confiável, no meio do terremoto, é impossível.

De qualquer maneira, é possível falar numa evaporação da riqueza, ou se quiserem, numa adesão forçada à pobreza. Não se trata apenas dos detentores de ações do Lehman ou dos proprietários de um imóvel ainda não pago ao qual está atrelado um saldo devedor maior que o valor da sonhada e agora depreciada residência. Nessas condições, não serão apenas os ianques que reduzirão suas importações. Admitindo, por um momento a imensa tolice de acordo com a qual, serão apenas eles, é possível respirarmos aliviados? Ocorre que os EUA, mais pobres, deixarão de importar de outros países também, o que promoverá choques nos exportadores do mundo inteiro, acarretando o enfraquecimento de outras economias, talvez de forma mais perceptível, até para nós. Temos pela frente uma U.E já às turras com a recessão, por méritos próprios. A continuar assim, nossas exportações evoluirão em que direção? Está bem assim, ou querem mais? É verdade que deixamos de lado os efeitos benfazejos das novas parcerias, habilmente costuradas com o Sudão, Gabão e outras potências, mas, com todo o respeito, será isso suficiente?

Fortunas derretendo impactam o consumo. Uma concessão mais criteriosa de créditos – depois da porta arrombada – promoverá maior estrangulamento da atividade econômica - aqui e alhures. Juros crescentes tenderão a asfixiar as economias. Já que juros em queda permitiriam a volta da inflação, com as conseqüências conhecidas, é possível que venha algum aperto, associado ao crédito "curto". Infelizmente, o crédito dito curto é uma saída suicida. O drama de 1929 foi atribuído, em parte à ação dos responsáveis pela política monetária, que promoveram um aperto de liquidez. Nessa não cairemos mais. A essas alturas, a alavancagem ou leverage foi promovida a palavrão. "Desalavanque-se", pois, mas com moderação.

Sim, mas a China... A China, como todo exportador terá que diminuir seu crescimento. Será ainda um crescimento sólido, mas é pouco provável que seja de dois dígitos, a não ser que abandone o sistema decimal. Mamãe, encolheu a Economia mundial!

É o fim do "neoliberalismo", como festejam alguns? Obviamente, não. O mercado é perfeitamente capaz de se ajustar, mas se deixado "solto" o fará com um número de baixas impossível de determinar. Daí as intervenções das autoridades monetárias, na tentativa de minorar os efeitos de erros passados. Estão despontando algumas variedades de PROER e poucos são aqueles que entoam a velha cantilena segundo a qual "estão dando dinheiros aos banqueiros".

E a Bolsa? É difícil arriscar qualquer prognóstico. Uma ou outra receita de enriquecimento rápido e sem risco deverão ser guardadas na naftalina, até que a memória de feridas recentes se apague. Em clima de salve-se quem puder é fácil tomar decisões erradas. De qualquer maneira, aqueles que pretendem investir hoje têm uma certeza: o farão a preços melhores que no mês passado. Se o farão a preços melhores ou piores que daqui um mês já é uma outra história. As cotações seguirão caprichosas como desde priscas eras tem sucedido.

Yes, mas nós temos a pré-sal. O maravilhoso líquido pegajoso que nos fará atravessar esse mar agitado por incertezas e crises, já está jorrando...por enquanto em discursos. Sucede que, até o momento, o petróleo do pré-sal serviu no máximo para sujar o macacão da mãe do PAC - as costas, como tão bem documentado, para júbilo geral. Temos, por enquanto, apenas uma despesa com lavanderia, uma incontestável, porém fraca contribuição ao crescimento do nosso PIB. Isso ainda não nos torna membros da OPEP. Pelo contrário, auto-suficientes desde abril de 2006, continuamos membros da OPIP. Isso mesmo: I de importadores. A fase 1A do Plano diretor da exploração do petróleo do pré-sal na Bacia de Santos prevê que em 2017 chegaremos a uma capacidade instalada de 1,26mi de barris por dia (adorável precisão; não serão 1,2 nem 1,3 e sim, 1,26), superior ao volume extraído por causa de exaustão das reservas – ainda não exploradas.

Portanto, termos tempo. Até lá poderemos descansar sobre o nosso colchão bilionário, sonhar com o nosso fundo soberano e comentar com absoluto conhecimento de causa o que tem sido a grande crise de 2008.

. Por: Alexandru Solomon, formado pelo ITA em Engenharia Eletrônica e mestrado em Finanças na Fundação Getúlio Vargas, autor de ´Almanaque Anacrônico`, ´Versos Anacrônicos`, ´Apetite Famélico`, ´Mãos Outonais`, ´Sessão da Tarde`, ´Desespero Provisório` , ´Não basta sonhar` e o livro/peça ´Um Triângulo de Bermudas`. (Ed. Totalidade). Confira nas livrarias Cultura (www.livrariacultura.com.br), Saraiva (www.livrariasaraiva.com.br), Laselva (www.laselva.com.br) e Siciliano (www.siciliano.com.br).| E-mail do autor: [email protected]

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