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01/10/2008 - 10:54

A mulher e a política

Dos quase 380 mil candidatos a prefeito e a vereador nas eleições deste 5 de outubro, no Brasil, apenas 21,34% são mulheres. Os números são do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que levantou o perfil da participação feminina na política. Ainda que as eleições deste ano possuam o maior número de candidatas em toda história brasileira, a margem de participação feminina na política representativa ainda é baixa. Esses números merecem reflexão. Por que, no Brasil, as mesmas mulheres que entraram de forma definitiva no mercado de trabalho, conquistaram independência econômica e se tornaram maioria nas universidades não se interessam ainda por política representativa?

A análise de alguns dados leva à constatação de que o país vive uma situação preocupante. De 1986, após a redemocratização, até 2002, foram eleitas apenas 76 deputadas federais. O número é similar em relação às assembléias estaduais e câmaras municipais. No cenário internacional, o Brasil está entre os 60 países com pior desempenho quanto à participação feminina no Legislativo federal. O percentual é de 8,8% na Câmara dos Deputados e de 12,3% no Senado Federal. Em abril de 2007, o Brasil estava na 104ª posição entre 189 países pesquisados, muito atrás dos outros países americanos.

Em 2006, quando a população brasileira era composta por 51,3% de mulheres e 48,7% de homens, apenas 9% do quadro do Congresso Nacional era de deputadas e senadoras, ou seja, 46 dos 513 deputados e nove dos 81 senadores. Na Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, a situação não é diferente. Das 94 cadeiras, apenas 11 são ocupadas por deputadas.

Embora o panorama não seja dos mais animadores, existem números a ser comemorados. Das dez maiores cidades do país, somente em Recife não existe uma mulher em posição de destaque nas pesquisas de opinião. São Paulo, Rio de Janeiro, Salvador, Fortaleza, Belo Horizonte, Curitiba, Manaus, Porto Alegre (que, aliás, possui três candidatas) e Belém apresentam nomes fortes para a disputa. E cruzando nossas fronteiras, constatamos que Chile e a Argentina, países vizinhos e com história política semelhante à nossa, elegeram, recentemente, presidentes mulheres. Isso sem falar em Hillary Clinton, que esteve muito próxima de ser a candidata democrata à presidência dos EUA.

Qual seriam os motivos para tão tímida participação feminina na política? Quem são as brasileiras que entram nos partidos políticos e disputam eleições? De maneira geral, acredito que as mulheres que se interessam por política são aquelas cuja família tem tradição política. Ou são aquelas que militam em movimentos sociais, na política participativa, ou, ainda, que exercem liderança em outros campos sociais e acabam vendo na política uma forma de legitimar reivindicações de classe.

E o que ainda impede que mais mulheres se interessem por esse caminho? Não existe uma resposta pronta. Mas o que pode ser constatado é que, na atualidade, a mulher passou a acumular jornadas de trabalho, dentro e fora de casa. Para a esmagadora maioria delas, os afazeres domésticos, a administração do lar e a educação dos filhos, no dia-a-dia, ainda são exclusivamente tarefas femininas. Como a divisão dos papéis dentro do lar ainda não está bem definida, as mulheres se sobrecarregam com múltiplas tarefas e se vêem com pouco tempo livre para outras tarefas, como participar do cenário político.

Se, por um lado, a mulher demonstrou que pode competir em igualdade em ocupações consideradas até há pouco tempo predominantemente masculinas, o mesmo não pode ser dito em relação aos homens. Grande parte ainda sente vergonha em compartilhar os trabalhos domésticos com esposas e companheiras. A mulher passou a acumular diversos papéis e existe até um "consenso" de que é natural que assim atue.

O compartilhamento das atividades dentro do lar de maneira mais igualitária seria o início da solução para esta questão e, certamente, permitiria que mulheres, hoje sobrecarregadas, pudessem participar mais ativamente dos movimentos populares e democráticos.

Em 1934, a Assembléia Nacional Constituinte reafirmou o direito ao voto feminino que havia sido assegurado em 1932, pela primeira vez, com o novo Código Eleitoral promulgado por Getúlio Vargas. Foi o resultado da bandeira erguida 10 anos antes, em 1922, pela líder feminista e política paulista Berta Lutz, filha do cientista Adolfo Lutz. No entanto, o voto só era obrigatório para mulheres que exercessem algum tipo de função remunerada em cargos públicos. A obrigatoriedade mesmo só veio com a Constituição de 1946.

Após mais de 50 anos, em 1997, a cota reservada para candidatos aos cargos eletivos foi ampliada a um mínimo de 30% para o público feminino. Como sabemos, esse percentual não está sendo cumprido nas atuais eleições, mas pode ser rapidamente alcançado se a estrutura familiar for flexibilizada, se o homem, que já divide a responsabilidade pela provisão de recursos, também dividir a responsabilidade pela educação dos filhos e pelos cuidados da casa. Na prática, a mulher precisa ter mais tempo para se dedicar a atividades em sua comunidade, que a induzirão a abraçar a atividade política. Somente assim os números, hoje inexpressivos, poderão ser revertidos. O cenário atual não condiz com o perfil aguerrido das brasileiras.

. Por: Vanessa Damo, deputada estadual pelo Partido Verde, em São Paulo; foi a parlamentar mais jovem a se eleger à Assembléia Legislativa em 2006, com 24 anos.

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