Página Inicial
PORTAL MÍDIA KIT BOLETIM TV FATOR BRASIL PageRank
Busca: OK
CANAIS

23/01/2009 - 10:49

Guarani: o tesouro enterrado do Brasil

Um erro recorrente de organizações governamentais, políticos e até mesmo cidadãos ao abordar o tema da escassez de recursos hídricos do planeta é focarem seus discursos apenas em rios, lagos e represas, ignorando a água que corre abaixo da superfície. Foi-se o tempo dos grandes rios como o Nilo: desde o século passado são os aqüíferos que evoluem para assumir o papel mais importante dentre as fontes de recursos hídricos. Com isso, o nome do Brasil desponta entre os círculos internacionais; nosso país é o principal "acionista" de um dos maiores tesouros enterrados do planeta: o Sistema Aqüífero Guarani (SAG, dividido com Argentina, Paraguai e Uruguai).

Deve-se notar que a vantagem essencial dos aqüíferos consiste em estas serem fontes consideravelmente menos sujeitas à degradação do homem do que, por exemplo, os rios. No Brasil, sabe-se que 92% dos esgotos são despejados nos rios e 8,2% do lixo apresentam o mesmo fim através da ação pluvial. A contaminação, portanto, é certa e direta. No caso das águas que correm nos lençóis-freáticos, a filtragem natural da terra e seus processos biogeoquímicos dificultam a passagem de poluentes. Um esgoto que corra a 10m de distância, por exemplo, já é considerado seguro. Por outro lado, mesmo encontrando-se mais protegidos, os aqüíferos não estão imunes. Levam também mais tempo e custam mais dinheiro para despoluir. Em certos casos, a despoluição pode ser até mesmo impossível.

O aqüífero Guarani, por onde correm 37 trilhões de litros d'água, é o maior aqüífero transfronteiriço do mundo e ainda é considerado um dos mais bem preservados (segundo relatórios, a percentagem de poluição atual é insignificante, dentro dos padrões aceitáveis). Embora ele esteja sob constante risco de sobre-uso e contaminação, ainda não existem problemas realmente sérios causados por ambos os fatores.

Por ordem de prioridade, o sobre-uso é a questão de maior preocupação das autoridades e estudiosos. No Brasil, mais de 500 cidades já usufruem do aqüífero, entre as quais São Paulo, e acredita-se que se a expansão mantiver a mesma dinâmica sem novos planejamentos e regulamentação, em um futuro próximo a capital paulista pode sofrer com problemas de abastecimento. Na Argentina, Buenos Aires depara-se com uma problemática semelhante.

O uso para agricultura também preocupa. No Brasil, 61% da água extraída do aqüífero têm como destino o aproveitamento agrícola, sendo a maior parte aplicada em irrigação. Como apenas cerca de 3,5 milhões de hectares – de uma área de 120 milhões de hectares próprios para a agricultura – encontram-se atualmente em atividade, o risco de um futuro stress hídrico é grande. Indústrias alimentícias e de outros tipos (vide os produtores de cerveja, por exemplo) já estão correndo para a área.

[Como o processo de reabastecimento do aqüífero ainda não é plenamente compreendido por geólogos, existem dissidências nos estudos de sustentabilidade e a situação pode figurar-se mais otimista do que parece. De qualquer maneira, fato é que não vale a pena arriscar: este debate apenas atrasa os projetos de preservação do aqüífero.]

A segunda questão de ordem é a descarga de poluentes. Segundo Luiz Amoré, secretário-geral do programa de proteção ao Guarani, um uso extensivo de fertilizantes e pesticidas vem sendo aplicado em áreas de recarga do aqüífero, e parte deles vai parar na corrente d'água quando chove. Hoje o índice é ainda muito pequeno para preocupar, mas demonstra que o risco é concreto caso este uso aumente ou continue sendo usado irresponsavelmente. A ameaça do despejo de lixo e outros resíduos também está na ordem do dia (apesar da difícil penetração, ela é inevitável quando a quantidade de dejetos é massiva).

Desde 1996, existe um projeto de preservação financiado pelo Global Environment Facility (GEF/BIRD) cujo principal objetivo é conscientizar a população quanto à preservação dos recursos, agindo simultaneamente em problemas pontuais. A principal atividade no que concerne o Brasil envolve a fronteira com o Uruguai, onde as cidades de Rivera e Santana do Livramento vivem em total dependência do aqüífero e utilizam-no de maneira desordenada e irresponsável.

A importância da preservação do Guarani é clara, especialmente para o país que detêm a maior parte do aqüífero. Ainda que o controle do aproveitamento das águas não seja fácil, principalmente com a pressão das indústrias e das demandas populacionais (hoje 60,5% dos centros urbanos de São Paulo já dependem das águas subterrâneas do Guarani), ele se faz plenamente necessário.

E não falamos disto apenas por questões naturais. Em uma época na qual o principal freio do "fenômeno" chinês é a falta d'água, não se pode desprezar a chance do Brasil de assumir uma colocação privilegiada em uma nova maneira de administrar os recursos para um crescimento consistente e sustentável. O Guarani tem tudo para tornar-se não apenas a garantia de segurança hídrica para a região mais populosa do país, como também apresenta um grande potencial para movimentar a economia agrícola, auxiliando na produção de alimentos para exportação.

Fontes: http://www.tt.fh-koeln.de/publications/ittpub302101_21.pdf | https://confluence.cornell.edu/pages/viewpage.action?pageId=99190272

. Por: Mauro Kahn e Pedro Nobrega do Clube do Petróleo [www.clubedopetroleo.com.br].

Enviar Imprimir


© Copyright 2006 - 2024 Fator Brasil. Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por Tribeira