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16/03/2007 - 09:55

Censo com bom senso

Depois de convocar 17 milhões de pessoas no ano passado, o Censo Previdenciário promovido pelo governo federal entra em uma nova etapa. A partir de julho, o Instituto Nacional de Seguridade Social começa a convocar os segurados para refazer perícias médicas, atingindo cerca de 2,2 milhões de aposentados por invalidez. Quem tiver recuperado a capacidade de trabalhar, mesmo de forma limitada, poderá ter o benefício suspenso. A iniciativa é discutível e válida quando atua no combate às fraudes que oneram o sistema. Mas pode não ser justa.

O Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS) estima que cerca de 40 mil pessoas recebam o benefício, embora possuam vínculos trabalhistas com empresas. A lei proíbe que pessoas com carteira assinada recebam um centavo sequer da Previdência Social e não prevê exceções. Segundo o órgão, os beneficiados que fazem essa espécie de “jornada dupla” terão de devolver os vencimentos recebidos aos cofres públicos.

Essa determinação nos faz refletir sobre a situação dos 16 milhões de portadores de deficiência do País.

O assunto despertou minha atenção através de uma carta do cadeirante Sandro Amaro da Silva, presidente da Associação dos Deficientes do município de Votorantim, no interior de São Paulo. Ele afirma que o mercado formal brasileiro hoje absorve apenas 2% da mão-de-obra disponível entre os portadores de deficiência, contra índices de 30% a 45% de países desenvolvidos. Isso me faz lembrar que a legislação obriga empresas com mais de mil funcionários a garantir pelo menos 5% das vagas de trabalho a essas pessoas, sob pena de multas pesadas. Na prática não ocorre nem uma coisa nem outra.

Silva observa que a ameaça de cancelamento dos benefícios pode gerar um desestímulo aos portadores de deficiência que procuram trabalho formal. Em sua opinião, as pessoas ficariam diante de dilema: ou permanecem com a modesta, porém segura aposentadoria por invalidez, ou deixam o benefício do governo para trás e se arriscam de peito aberto no mercado, cientes de que haverá sempre o risco de demissão. Como se vê, não se trata de uma escolha simples.

Diante desse raciocínio, ele sugere uma flexibilização da lei, que permita ao portador de deficiência trabalhar em uma empresa privada sem o cancelamento total do benefício. As considerações de Silva enriquecem o debate em torno da questão. Já que não se não se pode pagar integralmente o benefício, que se encontre uma fórmula para custear pelo menos uma parte da aposentadoria por invalidez. Com esse recurso a mais, o deficiente teria um estímulo para trabalhar com carteira assinada no mercado formal. Mais: contribuiria como qualquer outro trabalhador com os cofres da Previdência Social.

Parece absurdo pensar em uma fórmula assim? Em minha opinião, o pagamento seria mais que justo. Na verdade, serviria para diminuir a dívida que o Estado brasileiro possui com esses cidadãos. Os portadores de deficiência continuam a enfrentar obstáculos diários em ruas e calçadas esburacadas, prédios sem rampas de acesso, enfim, benfeitorias previstas em lei, mas que nunca saem do papel.

O censo que vai avaliar as aposentadorias por invalidez seria um ótimo momento para se encontrar uma solução para esse problema. O governo não pode se preocupar somente com a economia que a suspensão desses benefícios pode trazer aos cofres públicos. Deve, sim, aproveitar essa ocasião para discutir a questão com a sociedade, reparando injustiças e estimulando milhões de brasileiros a ingressar no mercado de trabalho. Com dignidade e sem medo de serem felizes.

. Por: Milton Dallari, consultor empresarial, engenheiro, advogado e presidente da Associação dos Aposentados da Fundação Cesp. O e-mail para contato é o [email protected]

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