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09/04/2009 - 10:26

Revisão de contratos e a crise atual

Muito se tem discutido acerca da possibilidade de revisão ou resolução de contratos diante do cenário atual de crise financeira mundial. Essa ideia, por sua vez, decorre de uma teoria cujos preceitos já estavam presentes desde o Código Hamurabi. Trata-se da Teoria da Imprevisão, que, apesar de ser adotada há muito tempo, só foi positivada no âmbito cível no Brasil por meio do Código Civil de 2002.

Antes mesmo de a Teoria da Imprevisão ter sido positivada, a doutrina já havia sedimentado o seu entendimento sobre quais deveriam ser os requisitos para a sua aplicação:

a) vigência de um contrato de execução futura ou continuada;

b) alteração substancial das condições econômicas objetivas no momento da execução, em confronto com o ambiente objetivo no momento da celebração;

c) onerosidade excessiva para um dos contratantes e benefício exagerado para o outro;

d) imprevisibilidade daquela modificação.

A verificação de tais requisitos em um caso concreto, porém, não é tão simples. Isso porque cada contrato é diferente do outro, não só em relação à forma ou ao conteúdo, mas também em relação ao contexto sob o qual ele foi celebrado.

É necessário, portanto, levantar algumas questões para poder dizer se a revisão ou resolução será cabível. Qual a natureza da contratação? O risco é inerente ao objeto que foi contratado? A onerosidade se deu, de fato, pelas alterações inesperadas do cenário econômico, ou se deu pela volatilidade comum à operação, que, no momento da celebração, não foi bem avaliada pela parte?

Tudo deve ser analisado com muita cautela, pois, muitas vezes, resolver o problema para uma parte pode significar a ruína da outra. E ainda mais em uma situação de crise, onde todos estão frágeis e suscetíveis a prejuízos, a questão do equilíbrio contratual deve ser tratada com muita responsabilidade, pois os dois lados devem ser levados em consideração.

Na maioria das vezes é mais interessante a manutenção do contrato, mediante a recomposição de seu equilíbrio, no lugar de sua simples resolução, que além de gerar insegurança, pode afetar negativamente toda uma cadeia de indivíduos que se beneficiavam da existência daquele contrato.

O próprio Judiciário já externou o seu entendimento quanto ao tratamento a ser dado ao artigo 478 do Código Civil, que trata da Teoria da Imprevisão, mas que prevê como regra a resolução do contrato. Segundo o Enunciado nº. 176 da III Jornada de Direito Civil do Conselho da Justiça Federal: “Em atenção ao princípio da conservação dos negócios jurídicos, o art. 478 do Código Civil de 2002 deverá conduzir, sempre que possível, à revisão judicial dos contratos e não à resolução contratual”.

Na realidade, a melhor solução seria as próprias partes poderem, mediante acordo, restabelecer o equilíbrio contratual em uma situação de onerosidade excessiva. E, inclusive, é papel do advogado tentar conduzir tal processo de composição, evitando, assim, um desgaste no relacionamento mantido até então entre as partes.

Esse papel pode ser desenvolvido desde a celebração do contrato, antes mesmo de qualquer desequilíbrio ocorrer. Um mecanismo que vem sendo bastante utilizado é a inclusão de chamada cláusula de “hardship”, prevendo que, diante de situações que alterem substancialmente o equilíbrio do contrato, as partes se reunirão para renegociar suas cláusulas.

É claro que o conteúdo dessas cláusulas deverá variar de um contrato para outro, pois não é toda a hipótese de onerosidade excessiva que pode dar ensejo à revisão contratual. É necessária uma análise muito precisa da operação em questão para que o contrato possa prever as condições sob as quais ele poderá ser renegociado.

Finalmente, deve-se ter em mente que a crise não afeta todos e tudo na mesma medida. É importante ficar atento àquele contratante que, de má-fé, alegar onerosidade excessiva e alegar a Teoria da Imprevisão com base apenas no “embalo da crise”, mas que, para aquela contratação específica, não tenha sido afetado por ela.

. Por: Sonia Marques Döbler, advogada especialista em Direito Econômico e Empresarial, fundadora do escritório Sonia Marques Döbler Advogados - [email protected] | . Carla Hellu é advogada especialista em contratos do escritório Sonia Marques Döbler Advogados - [email protected]

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