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14/05/2009 - 12:45

As duas faces da insegurança alimentar

Em 2008, segundo documento recente da FAO (Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação), o total de pessoas subnutridas chegou a quase um bilhão, ou 15% da população da Terra. Em contrapartida, estatísticas da OMS (Organização Mundial da Saúde) mostram que o excesso de peso afeta mais de um bilhão de habitantes (outros 15% do total). Os dois dados costumam ser focados de maneira isolada e em fóruns diferentes no âmbito dos organismos multilaterais, eventos e congressos. Sua análise conjunta, porém, escancara uma dimensão mais preocupante: dois bilhões de pessoas — ou 30% da população do planeta — são afetadas pela insegurança alimentar, metade delas pela carência e a outra parte por hábitos errados.

São as duas faces de um grave problema, cujas soluções significam um dos maiores e mais complexos embates a serem enfrentados pela presente civilização. No tocante à subnutrição, a atual crise financeira e econômica pode levar ainda mais pessoas à fome e à pobreza, se decisões urgentes e medidas eficazes não forem adotadas. A própria FAO manifesta tal preocupação e tem feito reiterados apelos para a comunidade internacional ser proativa no cumprimento do compromisso de combater a inanição.

Atendê-lo implica o estabelecimento de uma nova ordem para a agropecuária, com adoção de políticas públicas mais eficazes em cada país e a solução de questões como os subsídios nos Estados Unidos e Comunidade Européia. Também são necessários US$ 30 bilhões por ano para investir em infra-estrutura rural e melhorar os padrões produtivos nas nações em desenvolvimento.

Quanto ao excesso de peso de um bilhão de pessoas e o fato de 300 milhões delas serem efetivamente obesas, a solução passa por um amplo processo educativo, incluindo campanhas institucionais por parte dos governos, além da mobilização da sociedade. Têm sido muito tímidas, ante a dimensão do problema em termos de saúde pública e qualidade da vida, as ações voltadas à melhoria dos hábitos alimentares e atividades físicas, bem como às rotinas menos sedentárias de grande parte da população mundial.

As consequências são dramáticas, conforme se pode constatar no estudo “Doenças crônico-degenerativas e obesidade: estratégia mundial sobre alimentação saudável, atividade física e saúde”, da OMS: até 80% das doenças coronarianas, 90% dos casos de diabetes tipo 2 e um terço dos cânceres poderiam ser evitados com mudanças de hábitos alimentares, atividade física e abandono do tabagismo. Atribuem-se 75% das doenças cardiovasculares a fatores de risco como colesterol elevado, hipertensão, consumo alto de gordura e baixo de fibras, falta de exercício e o vício de fumar.

Em termos gerais, as doenças crônicas atreladas à obesidade e maus hábitos alimentares e de vida figuram como principal causa mundial de mortalidade e incapacidade. São responsáveis por 59% dos 56,5 milhões de óbitos anuais. Fator agravante é que os males da alimentação e rotinas equivocadas, antes mais recorrentes no primeiro mundo, afetam de modo crescente também os países em desenvolvimento, somando-se às doenças peculiares dessas nações, como dengue, malária, tuberculose, hanseníase e outras moléstias infecto-contagiosas.

O termo insegurança alimentar, portanto, não pode mais ser tratado em contextos unilaterais e herméticos. Trata-se de uma questão de múltipla abordagem e viés político, exigindo programas públicos e internacionais integrados, bem como um grande processo educativo. Em termos nutricionais, a humanidade não pode mais se dar ao luxo de pecar pela falta e/ou pelo excesso. É preciso buscar com urgência um equilíbrio, dando de comer a quem tem fome e educando os que fazem de hábitos errados um fator de desperdício de comida e saúde. Este, com certeza, é o grande desafio a ser vencido, em paralelo à sustentabilidade econômica e ambiental.

. Por: Olga Maria Silverio Amancio, presidente do Conselho Regional de Nutricionistas (CRN) – 3ª Região — São Paulo/Mato Grosso do Sul. Livre-docente na área de Nutrição pela Universidade Federal de São Paulo, na qual é professora da disciplina de Nutrologia do Departamento de Pediatria.

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