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07/07/2009 - 12:34

Política pública de saúde e a politicalha eleitoral

Foi inadequada a exploração política — pela situação e a oposição — do linfoma que acometeu a ministra Dilma Rousseff. Trata-se de um desrespeito à sua própria condição de paciente e cidadã, bem como aos milhares de brasileiros portadores desse tipo de câncer, o quinto mais recorrente no mundo e cuja incidência tem sido a que mais cresce a cada ano. Além do abalo inicial provocado pelo impacto do diagnóstico, essas pessoas são obrigadas a lidar com questões complicadas, como a internação hospitalar, a burocracia do sistema público de saúde, as restrições dos planos de assistência médica e a dificuldade de acesso gratuito aos medicamentos.

Assim, ao invés de indesejáveis boatos, especulações e oportunismo de cunho eleitoral, o tema deveria inspirar autoridades e políticos à busca de soluções efetivas, a começar pela melhor orientação dos serviços ambulatoriais no tocante ao diagnóstico precoce, fundamental à cura. A partir da suspeita — aparecimento de gânglios, principalmente no pescoço, por vezes associados a febre, perda de peso, suor durante a noite e cansaço —, há exames muito eficientes, capazes de identificar a doença mais rapidamente, possibilitando a indicação mais precisa do tratamento para cada tipo de linfoma. Pesquisa da Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia (Abrale), que escutou 895 pacientes em tratamento, comprova a necessidade de mais esclarecimentos, pois 87,26% dos entrevistados jamais tinham ouvido falar da doença antes do diagnóstico.

Além da adaptação exigida na rotina, trabalho e relacionamentos, o paciente com linfoma e seus familiares precisam enfrentar enormes dificuldades, principalmente na obtenção de medicamentos e, em especial, a terapia dirigida ao alvo, mais moderna, que aumenta em muito as chances de cura e apresenta menos efeitos colaterais, pois ataca apenas as células cancerosas ou anormais. São produtos caros que, por lei — um preceito constitucional —, devem ser fornecidos gratuitamente pela saúde pública. Porém, nem sempre estão à disposição dos doentes. Muitas vezes, até os próprios médicos são “punidos” se prescreverem o que não está disponível no sistema. Esses e outros medicamentos de uso continuado acabam sendo objeto de imensa burocracia para os pacientes e seus familiares. Muitas vezes, é necessária ação judicial para a sua liberação. Aos pacientes não resta outra alternativa, considerando o preço e a longa duração dos tratamentos. Por isto, é muito grave a persistência de problemas na demora da atualização dos protocolos de tratamentos e na distribuição dos medicamentos de alto custo. Estas questões continuam sendo a principal ameaça na vida dos pacientes. Também é inaceitável que brasileiros continuem sendo constrangidos pela negativa de tratamento por parte dos convênios médicos/seguros-saúde, numa impune afronta à lei por empresas privadas que atuam nesse segmento. As mudanças da legislação que rege a matéria não deixam quaisquer dúvidas sobre a obrigatoriedade do pagamento. Ademais, linfoma não é hereditário. É adquirido em algum momento da vida, em qualquer idade e sem prévio aviso. Ou seja, sua cobertura sequer exigiria cláusula de doença preexistente nos contratos.

Como se vê, as dificuldades vividas pelos pacientes de linfoma e outras moléstias graves são muito mais complexas do que supõe a retórica eleitoral. Assim, em respeito e apoio à mulher Dilma Rousseff e aos brasileiros que têm a doença, seria educado e ético excluir o tema do debate relativo à sucessão presidencial. Por outro lado, a ministra de Estado, figura pública e potencial candidata, não deve ser poupada ou privilegiada no exercício do cargo e nos embates partidários em função do problema de saúde que enfrenta. São questões e desafios distintos. A abordagem do tema linfoma, de modo específico, está relacionada à política pública da saúde e quem sabe temos aí uma oportunidade para dar mais atenção às necessidades da saúde dos brasileiros! Com esperança, estamos todos torcendo pela boa resposta ao tratamento da ministra Dilma e de cada um dos brasileiros que, como ela, enfrentam a doença.

. Por: Merula Steagall, presidente da Abrale (Associação Brasileira de Linfoma e Leucemia) e da Abrasta (Associação Brasileira de Talassemia).

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