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14/08/2009 - 11:22

Crise no Senado, opinião pública e modernidade no Brasil

A substituição do poder do indivíduo pelo poder de uma comunidade constitui o passo decisivo da civilização. [...] A primeira exigência da civilização, é a da justiça, ou seja, a garantia de que uma lei, uma vez criada, não será violada em favor de um indivíduo. (Freud, S. O Mal-estar na civilização)

A atual crise política que tem seu epicentro no Senado brasileiro põe mais uma vez em evidência uma série de problemas que, em última instância, constituem os verdadeiros obstáculos que impedem o Brasil de realizar seu projeto de modernização e desenvolvimento econômico, político e social.

Dias atrás, na esteira de declarações, grampos e revelações vazadas dos corredores, gabinetes e tribunas do Congresso Nacional, uma conversa de Sarney com um outro senador, revelada pela mídia, teve o poder de clarificar parte da lógica operante na atual crise.

Atento às eventuais preocupações de colegas senadores (54 deles em final de mandato e de olho nas eleições de 2010) sobre as repercussões da atual crise no Senado, Sarney sacou a seguinte avaliação [creditada à sondagem do Ibope]: “A crise que engolfa o Senado ‘alcança’ as classes A e B, mas ‘não chega’ à base da pirâmide social, onde estão assentadas as classes C, D e E.” – como é comum nas grandes democracias, são essas classes que constituem a maioria que define os pleitos em processos eleitorais.

A mencionada avaliação converge com a percepção que boa parte da classe política expressa acerca do lugar da opinião pública no Brasil, bem como quanto ao “autismo” das elites.

Apontada como “mola principal das democracias”, a opinião pública (ou o seu vigor) é um importante indicador do padrão de sociabilidade de dada sociedade. Desde o século XVI europeu, tem ganhado paulatinamente importância, na trilha da modernização das sociedades ocidentais. Sabe-se que a conceituação sobre opinião pública abriga ambigüidades, mas seu mais generoso significado assenta-se na pluralidade que lhe deve ser caracterizadora, sendo assim instrumento para a conquista do bem-estar coletivo, manutenção da liberdade e defesa das populações contra a sempre presente ameaça de fazerem-nas massa.

Entre os sentidos de opinião pública, Gabriel Tarde destaca aquele de estrutura comunicacional, como fluxo regular de informações, pela qual se faz a circulação de temas/assuntos mobilizadores dos públicos e em que os indivíduos – como membros desses públicos – são convocados a um exercício regular de juízo.

Muito tem se falado da atual performance político-econômica do Brasil, particularmente de uma melhor inserção internacional do País. Entretanto, para o ingresso do Brasil em uma elite de nações desenvolvidas é necessário ir-se muito além do crescimento econômico.

A atual crise do Senado revela que, no que diz respeito à vida política do País, ainda não houve uma melhora qualitativa, que elevasse os padrões éticos orientadores da ação política e promovesse a participação ativa dos cidadãos neste âmbito.

Vera Chaia, cientista política e fundadora do NEAMP (Núcleo de Estudos de Arte, Mídia e Política), em recente pesquisa sobre o uso de novas tecnologias (internet) nas campanhas políticas no Brasil, constatou, entre outras coisas, que há “um certo ceticismo em relação à política e à possibilidade de mudanças em nossa sociedade” e que “O Brasil é um país com cerca de 45 milhões de pessoas que acessam a internet, mas não os sites políticos”.

Em outros países, como Espanha e Estados Unidos da América, a internet vem provocando mudanças qualitativas e quantitativas no que tange à participação dos cidadãos nos processos políticos, de forma a pressionar a classe política e os meios de comunicação convencionais a reverem suas práticas.

No Brasil, o uso cotidiano e diversificado da internet, inclusive como instrumento para o incremento da cidadania, ainda é muito restrito, fazendo com que o potencial inovador dessas novas tecnologias seja amortecido, incorporado de forma intensiva apenas em processos de produção e reprodução do capital e, perifericamente, pelos mecanismos tradicionais de dominação política.

Na história brasileira, o moderno, para se instaurar, faz concessões demais ao arcaico, e disso a atual crise do Senado é exemplo eloqüente.

. Por: Arnaldo Francisco Cardoso, cientista político, doutorando em Ciências Políticas pela PUC-SP e professor de Políticas de Comércio Exterior, Economia Global e Estratégias de Internacionalização de Negócios da Universidade Presbiteriana Mackenzie – Campus Tamboré.

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