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22/09/2009 - 13:09

Nossos idosos e os precatórios

Os estados e municípios podem ter lá seus motivos para empurrar para o futuro o pagamento de precatórios. Em função da crise, a arrecadação do ISS (municípios) e ICMS (estados) caiu e os repasses da União, baseados no Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) e no Imposto de Renda (IR) também recuaram. A maioria dos governadores e prefeitos trabalha com sérios déficits de caixa. O problema, porém, não é novo e se arrasta há anos. O atraso na quitação de precatórios vem de muito antes da crise. E os mais prejudicados são os idosos que estão nessa fila de espera, muitas vezes dependendo desse recebimento para comprar remédios e pagar aluguel. “Os detentores de precatórios não podem esperar muito, porque costumam ter a péssima mania de morrer”, diz Flávio Brando, presidente da Comissão de Precatórios da OAB/SP.

Precatórios são dívidas do poder público com empresas e pessoas físicas decorrentes de sentenças judiciais. Há os precatórios alimentares, decorrentes de indenizações trabalhistas, e os não-alimentares, a maioria envolvendo dívidas com desapropriações. Os credores ganham a ação na Justiça, mas depois são obrigados a entrar numa fila de espera. O governo do Estado de São Paulo, por exemplo, está pagando neste ano dívidas geradas por ações julgadas em 1998. São 11 anos de atraso.

Estimativas feitas por entidades envolvidas com a questão indicam que as dívidas pendentes de precatórios somam hoje cerca de R$ 100 bilhões em todo o país. Até abril passado, o débito do estado de São Paulo somava R$ 19,6 bilhões – R$ 13,8 bilhões em precatórios alimentares e R$ 5,8 bilhões em não-alimentares. Desde o início de sua gestão, em 2006, o governo José Serra vem tentando acertar os precatórios. Conseguiu desembolsar apenas R$ 3,9 bilhões para pagá-los, segundo levantamento da Procuradoria Geral do Estado. A OAB-SP, em levantamento feito em 2008, revelou que 70 mil pessoas já teriam morrido sem receber seus créditos do estado.

Mais grave ainda é a situação da prefeitura paulistana, que ainda está pagando precatórios não-alimentares julgados em 2001. A dívida atualizada é hoje de cerca de R$ 12 bilhões (era de R$ 9,6 bilhões até dezembro do ano passado, segundo o Tribunal de Contas do Município). É assustadora ao se considerar que representa 50% do orçamento do município. Muitos idosos ainda partirão sem receber o que lhes é devido. É um calote injustificável, uma vergonha para a nação.

O problema é muito sério. O Congresso, pressionado pelos estados e municípios devedores, está tentando encontrar uma saída. A Ordem dos Advogados do Brasil acompanha de perto as negociações para evitar que se institucionalize “um calote”. O Senado aprovou a Proposta de Emenda Constitucional 351/2009, originada da antiga PEC 12, e encaminhou o texto à Câmara, onde agora tramita como PEC 395/2009 e já foi aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça.

Uma das propostas contidas nessa PEC 395 prevê destinar ao pagamento de precatórios percentuais mínimos das receitas municipais ou estaduais. Por essa fórmula, segundo a OAB, estados como São Paulo, Rio de Janeiro e Minas, que detêm elevados orçamentos, conseguiriam eliminar seu estoque de precatórios em menos de 15 anos, sem qualquer desconto. A mesa saída, no entanto, seria impossível para a prefeitura paulistana e estados como Espírito Santo e Paraná, com um volume de endividamento muito grande na proporção com suas receitas. Esses, gastando o mínimo da Receita Corrente Líquida (RCL) exigido pela PEC, só conseguiriam quitar as dívidas com seus precatórios em até 15 anos se impusessem altos deságios - de 72% (São Paulo), 87% (ES) e 45% (PR). Nesse caso, os credores receberiam somente 28% (capital paulista), 55% (PR) e 13% (ES) do que têm direito. Pior, os percentuais seriam, segundo a OAB, ainda menores para pagamento à vista. Sem juros, do montante a quem direito, o credor receberia apenas 7,7% em São Paulo, 4% no ES e 15% no PR.

Outros estados também enfrentam situações graves. No momento, a PEC 395 tramita na Comissão Especial da Câmara. A OAB, entre outras sugestões, vai defender a securitização pela União dos precatórios estaduais e municipais, através da entrega aos devedores de títulos de longo prazo do Tesouro Nacional. Essa proposta, no entanto, esbarra na Lei de Responsabilidade Fiscal, que proibe a União de refinanciar dívidas de entes subnacionais (estados e prefeituras).

As negociações, como se percebe, não serão fáceis. Afinal, o que está em jogo é uma montanha de dinheiro. Atrevo-me a deixar uma sugestão. Dos R$ 100 bilhões devidos em precatórios, que se defina uma fórmula para quitar imediatamente o que o Poder Público deve às pessoas com mais de 60 anos. Não é justo que fiquem na fila de espera. Não é humano tirar dos idosos o direito de terem o que comer, o que vestir, e o acesso a tratamento médico e moradia digna. É o mínimo que podemos exigir. Não se trata de um benefício, mas de um direito.

. Por: Milton Dallari, conselheiro da Associação dos Aposentados da Fundação Cesp e diretor de administração e finanças do Sebrae-SP

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