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27/04/2007 - 09:55

Pecuária nacional e a cana

Fatores climáticos têm mudado a face do planeta, mas o território brasileiro conservará condições de produção de alimentos em larga escala. Água e disponibilidade de terra para a agricultura são preponderantes para creditar ao Brasil benefícios gerados por uma agricultura ainda mais produtiva. A essas vantagens podemos agregar os benefícios que a Rodada Doha poderá gerar à redução de subsídios e a queda de tarifas no comércio agrícola mundial, que poderão elevar a participação brasileira através de cortes substanciais nas tarifas dos itens mais importantes com os países desenvolvidos, além de elevar as cotas de importação de produtos brasileiros.

Os países em desenvolvimento deverão acentuar nos próximos anos a compra de commodities agrícolas brasileiras e deverão ser os grandes compradores do nosso etanol e biodiesel. As mudanças que estão ocorrendo na matriz energética mundial estão impulsionando a produção de combustíveis renováveis no Brasil. Não há a menor dúvida de que o país deverá liderar esses segmentos do agronegócio mundial e o Estado de São Paulo será a locomotiva desse processo.

A disposição dos administradores públicos em incentivar a implantação de novas usinas de beneficiamento de cana é compreensível. Mas não se pode admitir que o entusiasmo em torno da cana prejudique o desenvolvimento de setores que também possuem peso inegável na balança comercial, como é o caso da pecuária.

Em 2006, as exportações de açúcar e álcool somaram US$ 7,78 bilhões contra US$ 7,39 bilhões de carne bovina e couros. Não nos colocamos contra o avanço da cana, como também ninguém culpou a cultura canavieira pela nossa incapacidade de produzir mais quilos de carne por hectare/ano, mas o Brasil precisa de projetos e não simplesmente uma corrida desenfreada na substituição da pecuária pela cana. Necessitamos de planejamento de longo prazo para reformular a pecuária paulista e avaliar o impacto ambiental e social desse processo.

Não devemos simplesmente acomodar, arrendar as nossas terras, abater nosso gado e comprar o kit cana: óculos escuros, bermuda, chinelo e a camioneta, virando, com num passe de mágica, fazendeiros de sucesso.

Não nos opomos à substituição das pastagens degradadas por cana. Estamos querendo delinear os novos cenários da integração cana-pecuária e tentar reformular os sistemas de produção para leite e carne no Estado de São Paulo. A pecuária paulista passará por transformações profundas, onde só haverá lugar para sistemas de produção ordenados em sintonia com a utilização de recursos genéticos de forma racional, inteligente e em consonância com o aproveitamento de resíduos da indústria canavieira.

O contra-senso na aplicação de recursos não se limita ao estímulo à cana-de-açúcar. Nos últimos anos, o governo federal destinou milhões de reais para fazer a reforma agrária, em doses inversamente proporcionais ao que foi gasto com a defesa agropecuária. É um contra-senso sim, estimular assentamentos no Estado de São Paulo em regiões onde estão surgindo novos pólos sucroalcooleiros. É um contra-senso sim, deixar de investir na defesa animal no estado primeiro exportador de carne bovina antes do foco de febre aftosa em 2005.

O objetivo básico das políticas públicas agrícolas e agrárias deve levar à inserção competitiva e sustentável da produção agrícola de todas as cadeias que compõem o sistema agroindustrial brasileiro e fomentar o equilíbrio entre elas.

Entre os anos 2000 e 2004, os investimentos em projetos de reforma agrária e agricultura familiar ultrapassaram os R$ 18 bilhões, enquanto os investimentos em pesquisa e desenvolvimento agrícola, extensionismo rural e defesa sanitária não alcançaram a casa dos R$ 4 bilhões. Sem contar os pífios recursos destinados à infra-estrutura de transporte, armazenagem, comercialização e sistemas de informação de mercado.

Concordo plenamente que o problema da pecuária nacional não é a cana, mas sim tudo aquilo que há muito se discute e aos poucos se enfrenta: difusão de tecnologia, relacionamento moderno entre os agentes da cadeia, seriedade governamental, agregação de valor e marketing. Porém, não posso deixar de afirmar que é uma heresia pretender que a cana seja a salvação da pecuária. A integração do binômio cana e pecuária pode sem dúvida se transformar num processo interativo com inúmeras combinações desejáveis para a pecuária de corte e de leite.

Não podemos ser indiferentes à preocupação do crescimento desordenado e sem planejamento, à falta de sensibilidade pela biodiversidade e com as conseqüências ambientais e sociais que podem trazer a monocultura sem um plano real de longo prazo.

.Por: Nelson Pineda é engenheiro, pecuarista e diretor técnico da Associação Brasileira dos Criadores de Zebu (ABCZ)

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