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30/09/2009 - 12:12

ABIC, Verdades sobre a rotulagem do café

Nas últimas semanas, temos assistido a uma invasão de artigos, e-mails e outras formas de comunicação, expedidas pelo monodiscursivo presidente da Associação Paranaense de Cafeicultores – APAC, a respeito de uma inconseqüente idéia de adoção de um sistema de rotulagem para o café industrializado, pelo qual as embalagens deveriam especificar as quantidades de café da espécie arábica e da variedade conilon usados em sua composição.

A propalada justificativa para a iniciativa seria a de bem informar aos consumidores a respeito da composição do café, como se isso lhes fosse importante conhecer para bem consumir os produtos.

A verdadeira justificativa para esta irresponsabilidade defendida por um diretor de uma entidade da produção, que nada tem a ver com a industrialização do produto e que nada conhece sobre os hábitos e demandas dos consumidores, é a absurda e irreal tentativa de inibir o consumo de cafés produzidos com conilon em seus blends, sob o pretexto ilógico e incorreto de que o café conilon seria produto de menor qualidade, logo, os consumidores o rechaçariam, dando preferência a produtos feitos com café arábica.

Sonha o presidente da APAC, com isso, adicionar valor ao café arábica, do qual diz ser produtor, enxergando na cultura do conilon um concorrente para a sua atividade, que pretende enfrentar criando obstáculos para a indústria de café, que utiliza as duas matérias-primas.

A verdade é que o café no Brasil não necessita de nenhuma outra lei de rotulagem, pois já as tem, tanto as oficiais e obrigatórias, quanto as privadas e voluntárias.

A verdade é que, no Brasil, as embalagens de café de centenas de marcas já trazem informações importantes e suficientes para orientar o consumidor quanto à dosagem correta para preparação; sobre as origens do grão, inclusive algumas com o nome das fazendas de onde ele provém; sobre o ponto de torra e a granulometria, forma de colheita e outras tantas.

A verdade é, também, que o Brasil possui o mais completo e moderno sistema de indicação das características físicas e sensoriais do café em uso no mundo, na forma do Perfil do Sabor, que é impresso nas embalagens das marcas de café certificadas pelo Programa de Qualidade do Café – PQC, que monitora, até o momento, mais de 310 marcas. O Perfil do Sabor, do PQC, indica sete características de qualidade: tipo de bebida, ponto de torra, granulometria, intensidade do aroma, do sabor e do corpo, alem do tipo do café, com uma descrição orientativa da composição de arábica e de conilon. Mas esta descrição não é quantitativa, pois isto é impossível de controlar e monitorar. Destaque-se que isto tudo é feito de forma voluntária pelas indústrias de café, não havendo, e nem sendo necessária, nenhuma lei que as obrigue ou as condicione a fazê-lo.

Qual a razão, então, das indústrias se preocuparem com o discurso monótono e absurdo do presidente da APAC, que, aliás, está sendo conhecido por ser pessoa que gosta de falar e escrever sobre coisas que desconhece, sem qualquer base conceitual ou técnica? O discurso seria ridículo, se não fosse perigoso.

A questão prende-se aos riscos e prejuízos à qualidade do café que tal estultice acarretaria, se implementada.

A indicação obrigatória das quantidades de arábica e de conilon nas embalagens, condicionaria as torrefadoras a nunca mudarem esta composição, sob pena de fornecerem declaração falsa, o que jamais as indústrias responsáveis fariam.

Com isso, os cafés estariam sujeitos a mudanças de sabor e de aroma a cada lote produzido, uma vez que os grãos utilizados, tanto de arábica quanto de conilon, variam de safra para safra; de região produtora para região produtora; variam em função do clima à época da colheita; variam em função das práticas de colheita e de secagem que os produtores utilizaram, variam, enfim, por inúmeras razões. Será que os consumidores gostariam de cafés que mudam de aroma e de sabor a cada aquisição ou período? É lógico que não!

A técnica de blending adotada pelas indústrias de café de todo o mundo, assim como ocorre na fabricação de whisky, vinhos e outras bebidas, e que consiste em combinar grãos de espécies e de variedades distintas, em diferentes porcentuais, é usada exatamente para corrigir as variações de cada lote de grãos, preservando, isto sim, as características do produto final, que não devem mudar e que conferem a personalidade e o sabor de cada marca.

É isto o que o consumidor quer. Um café saboroso, que lhe dê prazer e satisfação, sem se importar com qual quantidade de conilon ou arábica foi utilizada. Aliás, a enorme maioria dos consumidores não sabe o que isto representa.

Ademais, a composição de cada blend é um patrimônio de cada empresa, que é definido após exaustivos ensaios e pesquisas, tem custo elevado de desenvolvimento, sendo, portanto, um segredo industrial que tem que ser respeitado, como acontece em qualquer lugar do mundo.

Por outro lado, esta irresponsável idéia não tem como ser fiscalizada, isto é, não há como fiscalizar as marcas e identificar se a declaração de quantidades nas embalagens está ou não correta. Isto porque, não existe, em todo mundo, tecnologia ou metodologia para quantificar as espécies usadas. O que existe é a identificação histológica, em microscópio, que reconhece a existência das espécies, mas não consegue quantificar os porcentuais usados. Assim, essa lei jamais poderá ser fiscalizada, permitindo que maus empresários pratiquem fraude sem serem molestados.

A verdade é que o conilon desempenha um papel importante na produção de cafés com características bem definidas. O conilon corrige o gosto verde dos arábicas colhidos imaturos; o conilon confere mais corpo à bebida final; o conilon equilibra o blend quanto à acidez e, portanto, justifica o seu uso pela indústria de café de todo o mundo e do Brasil também. Seus porcentuais variam de acordo com as exigências do blend e também por razões econômicas, pois seu custo pode ser determinante para manter cafés com preço acessível para o grande público consumidor. A espécie canephora ocupa 34% da produção mundial, sendo hoje uma realidade que ninguém contesta, ao contrário, se busca aperfeiçoar para permitir mais ganho de renda a um número maior de produtores de café.

Finalmente, ao presidente da APAC faltam conhecimento e base em pesquisas para intitular-se defensor das vontades dos consumidores. A justificativa única da rotulagem, qual seja a de prestar melhores informações aos consumidores, não encontra eco na realidade. A pesquisa “Tendências do Consumo de Café no Brasil”, feita desde 2003 pela InterScience – uma das maiores empresas de pesquisas de opinião do Brasil – em conjunto com o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, e considerada uma das melhores em todo o mundo cafeeiro, evidencia, claramente, que aos consumidores o Conceito de Qualidade do café não está associado ao tipo de grão e às suas espécies. Isto não aparece nas respostas espontâneas dos consumidores (ver em www.abic.com.br/pesquisas)

Da mesma forma, na pesquisa dos Determinantes de Compra, o tipo do café é citado por apenas 1% dos entrevistados, ao passo que Marca, Preço, Sabor e Qualidade aparecem como os principais determinantes. Isto demonstra como a proposta de rotulagem está mal fundamentada, é fraca e inconsistente e revela, por outro lado, que o seu verdadeiro propósito é o de denegrir o café conilon.

O presidente da APAC, ao divulgar a proposta discriminatória de rotulagem, ao mesmo tempo em que demonstra seu desconhecimento sobre as propriedades positivas do conilon, mostra também seus objetivos de buscar notoriedade, perseguindo outra idéia sem sentido algum, qual seja a de eleger-se presidente de uma inexplicável Associação Brasileira do Café Arábica. E sonha, ainda, em ser o presidente de uma associação similar, mas mundial. Não fosse caso de vaidade incontrolada, seria simplesmente risível.

A discussão sobre a rotulagem do café, da forma como foi colocada, é, por fim, um profundo desrespeito aos trabalhos que as indústrias de café têm realizado, notadamente ao longo dos últimos 20 anos, período em que se conseguiu triplicar o consumo interno de café, com melhoria da qualidade e estimulo à demanda por produtos de alta qualidade e com alto valor. O mundo inteiro reconhece este mérito da ABIC e da indústria de café brasileira. É também um desrespeito aos milhares de produtores de café conilon do Brasil, cuja competência os fez suplantar os tempos de crise vividos por algumas regiões produtoras de café arábica.

A ABIC hoje persegue a ampliação da demanda por cafés superiores e gourmet, certificados e sustentáveis, com maior valor agregado, que aumentam a renda dos produtores e dos industriais, estimulando seu uso na hotelaria nacional, nas licitações públicas e privadas, nas panificadoras, casas de café e supermercados. Para tanto, mantém cooperação com as Secretarias da Agricultura de Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Espírito Santo e Bahia, entre outras.

Esta é a contribuição de uma entidade responsável e comprometida com a melhoria dos negócios do café.

O autor da esdrúxula proposta melhor faria se dedicasse seu tempo a ajudar seus associados e produtores a buscar melhores resultados na lavoura, com aperfeiçoamento da gestão, redução de custos, aumento da produtividade, melhoria de qualidade, certificação e inserção em mercados de maior valor, além de outras iniciativas típicas da atividade produtiva que podem recuperar a renda da atividade.

A cafeicultura do Paraná, que tantas glórias e histórias de sucesso já conquistou e que tantos valorosos líderes já produziu para o Brasil, não merece a contribuição que o presidente da APAC está dando hoje ao setor.

. Por: Nathan Herszkowicz, diretor-executivo da ABIC.

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