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20/10/2009 - 12:50

Setor Externo, por Hélio Nogueira da Cruz

Está em curso uma “conspiração benigna” voltada à formação de expectativas favoráveis sobre o futuro da economia mundial. Sabe-se que, frequentemente, as flutuações das atividades econômicas promovem altas e baixas bastante agudas nas variáveis econômicas antes de se atingir os períodos de menor volatilidade.

Mas, nesta crise as oscilações foram bruscas demais. O discurso que defende a posição de que a crise econômica acabou e que a situação está normalizada e em tempo ocorrerá a retomada dos investimentos e a volta do crescimento econômico apoia estas expectativas positivas. Notícias como a divulgação de prognósticos mais favoráveis do FMI − que vinha apresentando cenários pessimistas e agora prevê redução da queda do PIB mundial em 2009 de -1,3% para -1,0% e crescimento de 3% para 2010 − favorecem esta “conspiração”. De forma compatível com este movimento, já se discute, tanto no exterior como no Brasil, a necessidade de elevação dos juros e a redução dos déficits públicos, agravados pelas políticas anticíclicas, ou seja, retornase à ortodoxia econômica. De acordo com esta visão, o setor financeiro, cujas regras de operação geraram boa parte dos recentes efeitos “manada” profundamente desestabilizadores, estaria bem e nada precisaria ser alterado. Contrárias a esta postura, restam apenas as poucas vozes dos contumazes pessimistas, que nunca se convencem da estabilidade do sistema econômico internacional e se preocupam excessivamente com a permanência dos altos níveis de desemprego, a desvalorização dos preços dos imóveis em numerosos países e o baixo volume de produção em relação ao primeiro semestre de 2008.

Boa parte deste debate está associada ao conflito de ideologias e posturas teóricas e não aos fatos reais, que são utilizados, sobretudo, para confirmar as visões iniciais já estabelecidas. Desta forma, não se reconhecem as particularidades e especificidades desta crise, setor externo que é a mais profunda ocorrida desde 1930. Deixa-se de estudar o tema mais estimulante a ser tratado, ou seja, a surpreendente, forte e rápida recuperação dos índices das principais bolsas de valores e a queda do dólar, quando os indicadores do lado real da economia permanecem negativos ou apontam para a ainda precária recuperação econômica.

No caso do Brasil, as razões para o otimismo recente são mais fortes, uma vez que a crise internacional atingiu a economia brasileira de forma menos aguda, embora também tenham ocorrido bruscas quedas do real e um “empoçamento” da liquidez. Esta crise teria servido principalmente para encorajar o Executivo e as Autoridades Monetárias a adotar algumas medidas que, em muitos casos, já estavam maduras há longo tempo, como a redução da taxa de juros. Note-se que a desvalorização do real durante a crise já está sendo anulada pela atual valorização. A queda do volume do comércio internacional, menor que a prevista originalmente, está sendo revertida como se mostra adiante, sobretudo, pela forte expansão da China e de outros países emergentes, e a recuperação do preço das commodities. De acordo com a visão ortodoxa, as ameaças ao equilíbrio do sistema estariam no aumento dos gastos permanentes do governo, tais como a elevação dos salários e as novas contratações, que devem ser combatidas para evitar a inflação. Da mesma forma, a taxa de juros deverá elevar-se logo adiante, para conter uma demanda agregada que pode se tornar excessiva. De fato, o Brasil sofreu menos com a crise internacional que as grandes economias, com exceção da China, e o PIB deste ano deve permanecer no mesmo patamar de 2008, o que é muito pouco, tendo em vista a evolução dos últimos anos.

De qualquer forma, a economia brasileira permanece fortemente vinculada 6 outubro de 2009. Os artigos da seção Análise de Conjuntura foram escritos entre 14 e 16/10/2009. às oscilações da economia global. Deve-se considerar, ainda, que a recuperação da economia mundial é frágil e o horizonte permanece incerto.

No que se refere propriamente ao setor externo da economia internacional, observa-se a queda dos fluxos comerciais internacionais acima de 20% neste ano em relação a 2008. Os países fortemente vinculados às transações internacionais, como o Canadá, México, Japão e Alemanha, foram os mais atingidos pela crise.

A balança comercial brasileira de setembro gerou superávit de US$ 1,33 bilhão, o menor resultado mensal do ano, com exportações de US$ 13,86 bilhões e importações de US$ 12,53 bilhões. No acumulado do ano, de janeiro a setembro, o saldo comercial é de US$ 21,27 bilhões, 8,1% a mais que o mesmo período de 2008. As exportações registraram queda de 25,1%, somando US$ 111,78 bilhões, e as importações recuaram 30,3%, somando US$ 90,51 bilhões. Quando se considera o período que inclui até a segunda semana de outubro, o superávit acumulado atinge US$ 22,051 bilhões, valor 9% superior ao verificado em igual período em 2008, com exportações de US$ 116,542 bilhões e importações de US$ 94,491 bilhões.

De janeiro a setembro as exportações de manufaturados do Brasil caíram 31,2% e de produtos básicos 14,4%. Apenas as exportações para a Ásia, particularmente a China, cresceram. As importações caíram em todos os itens, principalmente as matérias-primas e combustíveis em relação aos bens de capital e de consumo.

Note-se que o real ainda não atingiu o nível máximo de valorização de agosto de 2008, quando atingiu a cifra de 1,559 de real por dólar. Neste ano, o real apreciou-se 34,42% em relação ao dólar, 49,35% em relação ao peso argentino, 33,73% em relação ao iene e 29,10% em relação ao euro, importantes parceiros comerciais do País. Nestas condições, as exportações brasileiras estão enfrentando grandes dificuldades para se manterem competitivas.

A incipiente recuperação da economia internacional e brasileira recoloca os temas associados à construção da estrutura produtiva, ao aprimoramento dos recursos humanos e ao fortalecimento do Sistema Nacional de Inovação. Os evidentes estrangulamentos nas áreas de transporte e energia exigem investimentos significativos. Às vésperas do ano eleitoral de 2010, a tendência do governo é buscar notícias favoráveis, como o anúncio de grandes obras e projetos de grande magnitude, apesar das dificuldades de fazer deslancha o PAC. Esta pode ser uma boa oportunidade para o País promover um grande salto, superar seus “gargalos” e tornar-se mais competitivo.

Entretanto, há que se manter principalmente presente que o horizonte externo permanece nebuloso, a forte valorização do real ameaça significativamente o desempenho das contas externas já em 2010 e as taxas de juros permanecem muito elevadas. A reestruturação produtiva internacional em curso, que sofreu percalços e transtornos nesta crise, vai definir a nova divisão internacional da produção entre tipos de produtos, regiões e países. O Brasil precisa manter-se alerta e atuar na direção de papéis mais significativos no cenário internacional e mais favoráveis aos seus cidadãos. Os fenômenos reais, às vezes obscurecidos pelos vários tipos de “conspirações”, são os que contam a longo prazo.

. Por: Hélio Nogueira da Cruz, professor da FEA-USP/(E-mail: [email protected]). / Fipe

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