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30/06/2007 - 07:01

Crescimento vs. ambientalismo: agendas em conflito

A Agência de Pesquisas Ambientais da Holanda publicou, em 20 de junho, o que já era esperado por muitos analistas: em 2006, a China tornou-se o maior emissor global de gás carbônico (CO2), principal gás-estufa. O motivo seria o alto consumo de petróleo, carvão e gás natural – os chineses lançaram 6,2 bilhões de toneladas de CO2 na atmosfera no ano passado, contra 5,8 bilhões de toneladas lançadas pelos norte-americanos.

O governo chinês parecia estar preparado para a notícia. No início de junho, o presidente da Comissão Nacional de Desenvolvimento e Reforma, Ma Kai, reconheceu que a China tomaria dos Estados Unidos o posto de principal emissor de CO2 do mundo em 2008 – o prazo foi apenas antecipado em um ano. A afirmação foi feita no lançamento do primeiro plano chinês de combate à mudança climática, apresentado dois dias antes da Cúpula do G-8 na Alemanha. O documento não especifica mecanismos concretos de redução das emissões de CO2, embora se comprometa a controlá-las: o consumo energético deve ser reduzido em 20% até 2010, por exemplo. Ma, no entanto, ressaltou que o nível per capita de emissões permanecerá “apenas uma quinta parte do norte-americano”.

O novo plano chinês reforça a posição defendida por Pequim de que os países desenvolvidos e seus 200 anos de industrialização são os principais responsáveis pelo aquecimento global e, por isso, eles têm a obrigação de reduzir as emissões.

Foi seguindo este raciocínio que o porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Qin Gang, em resposta à pesquisa holandesa, afirmou que “é injusto que os países ricos comprem barato nossos produtos e depois nos condenem por poluir. Os países desenvolvidos têm transferido boa parte de sua produção para a China. As roupas, as moradias e mesmo os alimentos de muitos consumidores são produtos fabricados na China”.

Não apenas a transferência de produção deve ser culpada, segundo o governo chinês. Ma Kai também critica os países que importam produtos chineses intensivos[ em energia e que, segundo ele, deveriam assumir a responsabilidade pelas emissões tóxicas destes manufaturados. A China, segundo Ma, exportou 24 milhões de toneladas de aço em 2006, o que não é contabilizado como agressão ao meio ambiente pelos países importadores.

No que tange o consumo de carvão, outra frustração. Divulgadas pela primeira vez em março, as estatísticas do setor mostram que a China consumiu 2,5 bilhões de toneladas de carvão em 2006, 9,3% acima do consumo de 2005. A meta de redução, de 4%, ficou muito distante. Mais agravante foi a mudança do status chinês de exportador líquido de carvão, até o primeiro trimestre de 2007, para importador líquido do produto. A inversão do quadro ocorreu não por incapacidade de atender à demanda doméstica, mas devido ao fim dos incentivos tarifários à exportação do carvão e à adoção de incentivos à importação. Este cenário tende a forçar a redução nos preços do produto e a superutilização do recurso no mercado doméstico. Mesmo que as reformas das empresas estatais nos últimos anos tenham levado ao fechamento de muitas das fábricas mais poluentes – a emissão de alguns poluentes, incluindo dióxido sulfúrico, declinaram brevemente em 2000 –, o prognóstico para os próximos anos não é bom. Em 2011, de acordo com previsões da Economist Intelligence Unit (EIU), o consumo de energia do país aumentará para 86% do total do consumo dos Estados Unidos, contra 39% em 2000. Ainda que o consumo e as emissões per capita estejam bem abaixo de países como os Estados Unidos, isso também pode ser entendido como um problema em termos absolutos. Para contornar os apagões que ocorreram em 2004 e 2005, o país vem construindo grande número de novas usinas das quais a maior parte é termelétrica e, muito provavelmente, ainda não seguem padrões ambientais internacionais, segundo analistas do EIU.

A poluição da água também é severa. O país tem apenas 6,5% das fontes renováveis mundiais, ao mesmo tempo em que abarca aproximadamente um quinto da população do globo. Além de as fontes existentes não serem distribuídas adequadamente, a escassez de água é agravada pelo uso irresponsável por parte das indústrias e pela poluição. Apenas metade do esgoto é tratado e, até o final de 2005, 278 das 661 maiores cidades chinesas não tinham estações de tratamento sanitário.

Diplomacia e vizinhança – O governo chinês admite que seus problemas ambientais afetam até sua política externa. O vice-ministro chinês de meio ambiente,Pan Yue, reclamou à imprensa que “as missões chinesas vão ao exterior para assegurar fontes energéticas, ao passo que missões estrangeiras vêm à China para conversar sobre o impacto ambiental do país. É uma diplomacia paradoxal”.

Para seus vizinhos, a China é uma ameaça ambiental em diversos níveis. Por ser o maior produtor e consumidor de carvão do mundo, não é surpresa que o país seja também o maior emissor mundial de dióxido sulfúrico, o que tem provocado reclamações de Japão e Coréia do Sul – culpam a China pela chuva ácida em seus territórios. Tempestades de areia, resultado de processo de desertificação, também são problema para os países vizinhos.

No final de 2005, a explosão de uma planta química no norte da província de Jilin espalhou uma língua de benzeno tóxico de 80 km de extensão pelo rio Songhua. Apesar das tentativas das autoridades locais em conter o vazamento, a cidade de Harbin foi obrigada a interromper o abastecimento de água, e até mesmo a Rússia foi atingida.

Já o plano chinês de duplicar sua capacidade hidrelétrica até 2010 preocupa a Índia. Diversos rios com nascente no Tibet tiveram sua capacidade de vazão reduzida por terem sido represados. O próximo passo seria modificar o curso do rio Brahmaputra para regiões áridas do noroeste chinês, apesar de engenheiros já terem considerado o plano inviável. Caso concretizado, o programa pode incitar animosidade com ambientalistas e políticos indianos.

As companhias chinesas precisam estar atentas à visibilidade internacional que o ambientalismo tem tomado, não apenas por parte de países e organismos internacionais, como também pelo mercado consumidor. O crescimento da consciência ambiental em mercados de alto padrão de consumo gera maior preocupação não apenas com a qualidade dos produtos, como também o quanto o produto está de acordo com padrões de respeitabilidade ao meio ambiente – embalagem, eficiência energética, reciclabilidade, biodegradabilidade. O aumento da consciência ambiental pode causar impacto nas exportações chinesas.

Crescimento vs. meio ambiente – Não parece haver, até agora, solução de curto prazo que compatibilize crescimento econômico com proteção ambiental na China.

A meta é dobrar o PIB per capita até 2020, de acordo com o 11º Plano Qüinqüenal (referente ao período 2006-10) e transformar o tamanho total da economia chinesa dos atuais US$ 2,6 trilhões em US$ 6 trilhões em 2020. Apesar de falhar no cumprimento dos objetivos de redução da poluição, o governo chinês parece estar mais atento ao desenvolvimento sustentável. Há maior pressão do alto escalão do Partido Comunista para a mudança, bem como maior atuação das organizações não-governamentais de meio ambiente na China e da própria população.

A mudança mais fundamental é a maior transparência e articulação da agenda ambiental com as políticas da cúpula do Partido Comunista. O 11º Plano Qüinqüenal enfatiza também a necessidade de crescimento sustentável e a qualidade da produção, além de apresentar diversas metas ambientais, como o corte de 20% da energia consumida per capita, redução de 10% do total das emissões dos principais poluentes, aumento da área florestada, melhoria no uso de água pela agricultura e indústria, e aumento da rede sanitária.

O que pode colocar esses planos em xeque é a excessiva prioridade conferida ao crescimento por parte dos empresários e políticos. Oficiais são recompensados pela atração de investimento e estímulo ao crescimento, o que favorece a aprovação de inúmeros projetos sem estudo de impacto ambiental.

Também é um agravante a confusão institucional do sem-número de agências governamentais de proteção ao meio ambiente, além da falta de poder do principal órgão, a Administração Estatal de Proteção Ambiental (SEPA, na sigla em inglês). A SEPA, por maior que seja o desejo de muitos políticos em transformá-la em ministério, é coibida por pastas mais poderosas. A atenção ao meio ambiente tende a continuar a sofrer impedimentos em função das conexões entre as grandes estatais e o conflito de interesses entre o governo central e as províncias.

A China esforça-se para dar fim à crise ambiental, porém a tarefa é hercúlea. Não se sabe se o governo central terá habilidade e estímulo suficiente para colocar em prática as promessas de implementar tecnologia mais limpa, reduzir emissões degases estufa e aumentar as penalidades. O que o país poderia fazer, por exemplo, é elevar o orçamento destinado ao meio ambiente: o investimento para conter a poluição, em relação ao PIB, passou de 1% em 2001 para 1,3% em 2005.

O montante, porém, ainda está abaixo da recomendação de 2% do PIB do Banco Mundial até 2020.Não obstante, o país tem potencial para se posicionar positivamente no cenário internacional no combate à mudança climática. É o maior beneficiário do comércio de créditos de carbono regulamentado pelo Protocolo de Kyoto, recebendo investimentos de indústrias poluidoras dos países desenvolvidos. No entanto, enquanto o país continuar a trilhar seu caminho de “fábrica do mundo”, conclusões como as do relatório holandês serão cada vez mais comuns.| Por: CEBC

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