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16/06/2012 - 08:17

Sustentabilidade


Em entrevista, Paulo Klingelhoefer de Sá, médico, especialista em Educação Médica, mestre em Saúde Pública, professor da Faculdade de Medicina de Petrópolis/Fase, professor da Pós-graduação em Educação Ambiental na PUC/RJ, ambientalista nos fala sobre o tema, em tempos de Rio+20. Ele que também já foi secretário de saúde em Petrópolis (RJ), trata o assunto, a partir de uma visão médica, sobre a difícil tarefa de mudança de estilo de vida e consumo que o futuro impõe a sociedade e governos por conta dos desafios ambientais.

“Optamos pelo encanto e jogamos para debaixo do tapete o desastre” , comenta. Em tempos de celebração em torno do termo sustentabilidade, a sociedade se encontra na encruzilhada de optar por mudanças radicais ou não. O professor da Faculdade de Medicina de Petrópolis, Paulo Sá, dá uma visão da sociedade a partir da perspectiva médica, reflete sobre a opção de um novo modelo de vida e chama os profissionais de saúde à responsabilidade na construção desse novo caminho.

João Victor: a Rio+20, conferência sobre sustentabilidade da ONU, trouxe as discussões sobre ecologia e meio ambiente à cena. Mas já existiram muitos outros debates como esse sobre o tema. Em que essas conferências contribuíram para a discussão do momento? Paulo Sá: a I Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, em Estocolmo, na década de 70, já havia apontado claramente a necessidade de revisão sobre o nosso modelo de desenvolvimento devido à potencial mudança no clima e à escassez de recursos no futuro.

Esse problema é endossado pelo Relatório Brundtland, de 1987, que criou o termo Desenvolvimento Sustentável, mas que apresenta contradição intrínseca. Em 1992, ocorreu a Conferência Mundial sobre Meio Ambiente, a Cúpula da Terra, mais conhecida como Eco 92, no Rio de Janeiro, e criou a Agenda 21. Daí pra frente foram inúmeras reuniões e encontros para se discutir questões específicas como a mudança climática, passando pela desertificação, condição dos oceanos e comprometimento de ecossistemas. Nenhuma delas, efetivamente, proporcionou mudanças significativas no nosso modelo de desenvolvimento.

. JV: afinal, o que é ser sustentável? PS: Inúmeras são as contribuições para a compreensão sobre a complexidade do que significa sustentabilidade. Foco na economia verde e na tecnologia eco eficiente, espera-se avançarmos para a construção de uma maior resiliência frente às mudanças previstas.

Marcadamente, a partir da segunda metade do século XX, o avanço da ciência, do conhecimento e, consequentemente, da tecnologia, nos colocou diante do encanto e da possibilidade de desastre.

Se fizermos uma breve retrospectiva, desde a década de 70 do século XX, o Clube de Roma já apontava que o modelo de desenvolvimento de nossa sociedade, especialmente a ocidental, tinha os dias contados, uma vez que estava pautado na lógica do desenvolvimento ad infinitum. Como isso não existe, em algum momento, os recursos necessários para tal escassearão e, forçosamente, teremos que rever o nosso modelo de sociedade.

Optamos pelo encanto e jogamos para debaixo do tapete o desastre. No entanto, agora o tapete está alto, a sujeira está vazando para fora e não podemos mais tapar o sol com a peneira.

JV: por que você acredita que foi feita essa opção e por que ela é tão prejudicial a todos nós? PS: em tempos de pós-modernidade, conforme descreve Zygmunt Bauman no livro A Modernidade Líquida, a concentração dos interesses da sociedade no indivíduo, na satisfação de seus desejos, em tempo imediato, aqui e agora, tornou obsoleto o interesse pela coletividade. Os valores, a ética, a disputa política, as instituições, família, escola, casamento, foram relativizados e submissos aos interesses egóicos mais imediatos. O consumo de tudo e de todos passou a ser a nova religião.

O que não queremos ver é que essa conta não fecha. Hiper consumo e recursos naturais finitos. Nossa forma de viver e mudança climática. Esses são fatos hoje inquestionáveis, mas insistimos em não assumir a nossa responsabilidade.

Não somos extraterrestres que circulam na sociedade sem ter nada a ver com os processos geradores de desequilíbrio. A crise socioambiental não nos interessa ou nos afeta? Só olhamos para o estrago já feito, as doenças? Empurraremos para debaixo do tapete os determinantes em saúde e doença relativos a essa questão, também? Adotaremos a sustentabilidade como a nossa bandeira maior porque só ela permitirá uma humanidade mais saudável? Ou não?

JV: como, então, nadar contra essa corrente do consumo nesse tempo de pós-modernidade? PS: para isso teremos que abrir mão de um modelo de pensamento, de uma racionalidade pautada no consumo. Inclusive na saúde, por conta dos equipamentos, medicamentos e outros, muitas das vezes utilizados de forma desnecessária e abusiva.

Trataremos dessa questão como tratamos muitas doenças, abafando-as com medicamentos até elas agravarem mais na frente? Faremos a mesma coisa que estamos propondo com o ambiente, através do investimento na tecnologia e economia verde, para depois lamentarmos o desastre mais na frente? Por que decidimos não enfrentar o elemento causador do desequilíbrio, o nosso estilo de vida, nosso modelo de sociedade? Exagero ou não, estamos em tempo de debater e mudar os nossos rumos. Na Rio+20, 20 anos após a Eco 92, os países se voltam para o tema novamente. Os governantes discutem no seu fórum e a sociedade organizada promove evento paralelo, a Cúpula dos Povos.

JV: E em que os profissionais de saúde, de maneira prática e como agentes de transformação da realidade social, podem contribuir para essa transformação da sociedade? PS: A respeitabilidade dos profissionais de saúde nos confere obrigação para agirmos. Se ficarmos quietos, o preço da doença que atingirá a humanidade será impagável. Possivelmente, não teremos medicamentos ou equipamentos médicos para tal. E nós, o que faremos diante de tudo isso?

JV: o senhor tem a clareza da sustentabilidade com trabalhos especialmente focados na saúde, por favor nos dê sua versão sobre a reciclagem de lixo, no caso, para o estado e cidade do Rio de Janeiro? PS: ações pontuais de ONGs são válidas, mas sem a estrutura do poder público, a população acha interessante, mas a ação não perdura. A atuação do poder público deve ser no suporte às demandas que a comunidade apresenta.

O governo passado até começou um trabalho no município, mas só no Centro e nas regiões de classe média. Tem é que trazer os pontos de reciclagem para dentro das comunidades pobres.

Há dez anos desenvolvemos nas comunidades atendidas pelo Programa de Saúde da Família um trabalho sobre resíduos sólidos, envolvendo crianças e adultos. A pessoa recebe a orientação dos alunos da Faculdade de Medicina de Petrópolis e traz o lixo reciclável para as unidades de saúde geridas pela FMP.

Inicialmente, o lixo era levado até catadores que identificamos na comunidade. Com o tempo, montaram uma cooperativa na região e um caminhão passou a coletar o lixo reciclável nas unidades de saúde e levá-los até às usinas de reciclagem.

Tentamos uma parceria com o governo municipal, mas ele não respondeu. Estamos agora fazendo pressão na Companhia de Limpeza. Tenho 70 alunos disponíveis para fazer o trabalho de conscientização, mas para expandir o projeto precisamos do poder público.|João Victor/Spsbr

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